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Foto do escritorGiovanni Alves


 Neste documentário, fiz uma homenagem a meu pai, o doutor José Ubirajara Alves, advogado, falecido em 2 de outubro de 2023, aos 90 anos de idade, dez anos depois de eu ter concluído este video-documentário. Nele tentei resgatar a sua história de vida e de trabalho, que se misturam na minha memória, pois eu cresci vendo-o exercer a sua profissão com dedicação e zelo, naquele escritório de advocacia que ficava em nossa casa, e que foi para mim o primeiro contato com o mundo do trabalho. Foi com meu pai que aprendi a amar os livros e a escrever minhas idéias, pois desde cedo eu me habituei a ver as suas estantes repletas de obras jurídicas, e a ouvir o som ritmado da velha máquina de escrever Olivetti Lexikon 80, que ele usava para redigir as suas petições, e que eu, curioso e atrevido, aprendi sozinho a datilografar, imitando o seu gesto e o seu estilo.


Este videodocumentário contribui para o entendimento da profissão do advogado que, por um lado, exercia o trabalho por conta própria (meu pai tinha escritório onde atendia os clientes); e por outro lado, tinha o ganho como advogado assalariado do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Traíri/CE e de prefeituras de cidades do Interior do Estado do Ceará como Acaraú/CE nos idos do começo da década de 1970.


Por volta de 1976 - se não me falaha a memória - que tive a oportunidade de conhecer o interior do Estado do Ceará. Eu tinha pouco mais de 15 anos. Meu pai levou-me para viajar com ele para o trabalho no Sindicato de Trabalhadores Rurais. Fiquei impressionado com a pobreza e situação do homem do campo. Viviamos na época do regime militar na década de 1970.


Por motivos óbvios, sinto-me emocionalmente impedido de fazer uma análise critica completa e detalhada da fala do Doutor Ubirajara neste video. O Projeto CineTrabalho produz vídeos que possam ser utilizados para a reflexão sobre o mundo do trabalho. É importante estar atento à fala da pessoa que narra a experiencia vivida. O documentário Doutor Ubirajara, Advogado tem muitos elementos para refletirmos sobre a experiencia vivida dele como trabalhador "liberal".


Qual o significado sociológico do trabalhador liberal?


Na sociologia das profissões liberais, o trabalhador liberal é geralmente definido como um profissional que exerce uma ocupação de natureza técnico-científica, com formação e competências específicas, seja por graduação ou curso técnico. Essas profissões são regulamentadas e fiscalizadas por uma entidade de classe, como a OAB, CREA e CRM. Como meu pai era advogado, a profissão dele era regulamentada pela OAB.


Os profissionais liberais podem trabalhar por conta própria, com ou sem vínculo empregatício, autônomo ou ainda como pessoa jurídica com CNPJ, sempre vinculados a um conselho de classe. Alguns exemplos de profissões liberais incluem administradores, advogados, corretores de imóveis, médicos, educadores físicos, enfermeiros, músicos, contadores, escritores, bibliotecários, biólogos, nutricionistas, entre outros.


No entanto, é importante notar que mesmo aqueles que trabalham por conta própria, sem vínculos empregatícios, o fazem para alguém, que compra os seus serviços (o cliente), detendo sempre um poder sobre o profissional que vendem tais serviços técnicos.  Portanto, a rigor, o trabalhador "liberal" – mesmo que não tenha vínculo empregatício, não tem total autonomia. Além disso, tem-se observado - por outro lado - uma crescente proletarização ou assalariamento desses profissionais.


Meu pai viveu o assalariamento como advogado trabalhando para o Sindicato de Trabalhadores Rurais e para a Prefeitura municipal de Acaraú no interior do Ceará. Embora tenha sido um profissional competente e dedicado a vida toda, sempre guardou uma mágoa pela exploração que sofria dos políticos que comandavam a Prefeitura local. Não era valorizado na sua atuação profissional. Tenho na lembrança muitas reclamações dele das oligarquias políticas locais - mesquinhas, hipócritas e assassinas. Apesar disso, meu pai nunca as confrontou.


Apesar de trabalhar para políticos de prestigio na região do Acaraú/CE, por exemplo, próximo do círculo do poder local, ele sempre foi um homem simples. Morreu pobre. Não deixou nenhum patrimonio. Meu pai mantinha relações fraternas com trabalhadores rurais, homens do campo, pessoas simples, sendo respeitado por eles como “doutor Ubirajara”.


O título de "Doutor" - por exemplo - é um título acadêmico concedido a estudantes que, após a graduação, passam em média de 4 a 5 anos desenvolvendo uma pesquisa científica sob a supervisão de um orientador. No entanto, os advogados são chamados de "Doutor" por conta de uma tradição e de um direito. No Brasil, o título começou a ser concedido no início do século XIX, primeiramente, aos médicos que defendiam uma tese. Em 11 de agosto de 1827, D. Pedro I, mediante uma Lei Imperial, criou dois cursos: o de Ciências Jurídicas e o de Ciências Sociais. Na ocasião, também atribuiu aos concluintes de Direito o tratamento de doutor, seguindo o que já era corrente na Europa. Portanto, os advogados têm o direito de serem chamados de "Doutor", embora alguns possam optar por não usar o título. Meu pai optou por usa-lo por tradição e também por orgulho.

 

 


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